quinta-feira, 4 de junho de 2015

Lágrima de Sal



LÁGRIMA DE SAL

Lágrima de sal 
 Choro de silêncio
 Silencioso grito aflito
 Demasiadamente temperado
 Para quem ainda é pequenito 
 Fala todas as línguas
 Ao mesmo tempo
 Em nenhuma se identifica
 Não compreende a palavra violência
 Perturba seu pensar de menino 
 E seu sonho de fantasia
 Tem ideais ainda insonsos 
 De criança de atenção faminta
 De vida impia
 Com vida salgada
 Porque criança acredita
 Que falhe a pontaria
 De quem aponta uma arma
 Compulsiva é sua lágrima de sal 
 Consome e corrói de forma mortal
 Por dentro e por fora
 Tem lembranças da família
 É sua única herança
 Herança inglória
 É lembrada com lágrima
 Com efémero sabor a sal 
 Ficou só, somente só!
 No meio de muita gente
 Somente gente
 De sentimentos ausente
 De cabeça baixa
 Seu olhar no chão 
 Não se levanta
 Gente que também medo
 De tudo...de toda a gente

Era invadido de medo intenso
 Pelo som de cada tiro
 Em sua mente de menino
 Sangravam lembranças
 De batalhas já sem esperanças!
 A outros entes sós
 Se juntou também
 Tornando-se multidões de solidões
 Todos são iguais 
 Somente, tão igualmente sós...
 Tão igualmente iguais
 Como lágrimas de sal
 Lágrimas fatais
 Sem sorrisos nem gargalhadas
 Com a tez cinzenta 
 De tudo que nada lava 
 Rostos empoeirados
 Onde só uma lágrima salgada cai 
 Abrindo sulcos e estradas

Se algum esgar de alegria aflora
 Um pouco de tudo
 Neles se partilha e brota
 Um pouco de nada, 
 Com um de tudo dentro
 Eles são os palhaços
 Batem palmas 
 Fazem palhaçadas
 Brincam com o passado
 Como se lembram
 Onde se respirava tranquilidade 
 Palhaçadas que acabam
 Em silêncios de medo
 Gritos e choros de desespero 
 Agarram-se uns aos outros
 E com lágrimas em silêncio mudo
 Unem-se naquele lugar
 O lugar do medo 
 Como se fizessem um pacto
 De luto e vida eterna
 No meio de uma guerra
 Que não é deles
 Mas fazem parte dela 

O mundo vai-se aos poucos 
 Esquecendo-se deles
 A fome não os esquece
 Porque a imagem duma lágrima
 Não é o que parece
 As cores da esperança
 São um cinza emaranhado
 Com raios de vermelho.
 Ensanguentado.
 Sem credos ou cores
 Sem nacionalidade
 Suas expressões,
 Dizem tudo o que se passa 
 Palavras de sal em lágrimas
 Pedem o silêncio das armas
 Pois com armas a disparar
 Não há palhaços, nem palhaçadas
 Nem palmas
 Só medos e lágrimas de sal 
 No lugar do quase podia tudo
 Sem querer quase fazer nada 
 Linguagem que fala por si
 E quase tudo diz
 Numa lágrima de sal

Nada mais há para dizer
 Não há palavras para afagar
 Tão amargo lacrimejar 
 Só lágrimas caem...
 Falam!
 Já ninguém as ouve!
 As palavras são abafadas
 Pelo som das armas

Não se pode viver na indiferença
 Sem verter uma lágrima salgada
 Sem esperança
 Num vazio de impossibilidades
 Que não se quer tornar possíveis
 Realidades não inventadas
 Porque já nada há para inventar
 Só simplesmente razões 
 Que a razão tão bem conhece, 
 Para amargamente chorar...
 Lágrimas de sal...
 Estão presentes em todo o lugar
 Valas a céu aberto
 Cheiro a morte
 Não é preciso ver
 Quem for cego
 O cheiro poderá sentir!

Até ontem

Ana Rosa

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