domingo, 24 de junho de 2018

Ser mulher





Ser Mulher

(...) Sempre foi pau para toda a colher!
Manga arregaçada, 
p'los outros faz e fará
sempre o que puder!
Olhos verdes, olhar despertado
Vistosa e engraçada mulher 
de nariz empinado...
Joia em constante alvorecer
Raio de sol, manhã de promessas coroada
Pele morena, rosto rosado, 
como que p'lo vento beijado
sem pinturas e lavado...
Tudo nela era verdadeiro
desde o sorrir ao cheiro!
Nada nela soava a falso!
Ninguém a poderá desdizer
Tesouro valioso, difícil de ser encontrado
Quem a vida lhe deu, sempre lhe dizia;
---Que vaidade era pecado!
"rosto nascido belo, 
nunca se lhe deve chegar nada
jamais precisava de andar pintado"
Trazia na boca rubra um sorriso de beijo plantado!
Mas cuidado!...
Quando não eram falas de seu agrado
O caldo estava entornado!...
De nobreza, somente o porte herdado.
Sem desejos de enriquecer, 
pobre ao nascer, assim haveria de morrer.
Nunca olhada foi em algum lugar 
por estar suja, delida ou remendada 
Nunca nada tirou a ninguém, 
por tal se sentia honrada
Trabalhadeira como formiga
Casa cheia e farta
Voz melodiosa como cigarra
Herança única, que lhe foi deixada
por quem um dia um colo lhe deu 
por ele diariamente foi embalada
Sempre a vida a abençoou
por ela se sentiu amparada
e se algum dia se sentiu só, 
mas nunca abandonada
A vida vinha de mansinho 
seu rosto acariciava, 
tratando as feridas
que o sol diariamente matizava.
Sussurrava baixinho ao seu ouvido
como vento que passa
confessando -lhe um precioso segredo 
jurou que nunca seria revelado
Dizia-lhe que nunca deveria ter medo
O medo a vida estagna como pesado penedo!
Não havia dor maior, 
que viver em constante desassossego
Trazia consigo a fúria do horizonte, 
subiu ao cume da serra nevada
desbravou vales e montes
Sempre livre, sem que dada fosse como
perdida ou achada...
Não era cega, surda, nem tão pouco gaga
mas também não era santa 
...muito menos sábia!
Sabia mais a dormir, 
que muita gente acordada!
Mesmo no desânimo, 
quando a vida não lhe sorriu
Por tudo lutou
Deu tudo em troca de nada.
Também foi tudo!
Presente, passado e jurou que seria futuro!
Foi vida ferida de morte anunciada
Nunca desistiu de dizer ao mundo,
quem desiste nada vale, nem valerá nada
Já deveu, mas pagou!
com ninguém tem divida pendurada
É mulher vivida, mulher de vida
Trazia no rosto suas marcas
nas mãos, a força da foice e enxada
Nunca se arrependeu de nada
Somente tem um defeito, 
há quem lhe chame uma graça 
e com ela abençoada
Sabia falar sem gaguejar, 
Nasceu com língua sem trave
gostava de dizer o que pensava
mesmo que a muitos não agradasse
Nunca se arrependeu de nada
nunca traiu nem foi traiçoeira
Era danada para a brincadeira
tinha alegria no coração, 
Vivia pelas palavras apaixonada 
Não era bonita nem feia, 
não era de "peneiras"
Deste fato tinha vaidade
Necessitava de toda a gente
De uma coisa nunca teve necessidade,
de pedir a alguém perdão por mal causado
Se algum dia lhe questionassem
porque era assim 
diria não saber
Fizeram-na assim feliz 
solta ao vento e desenganada
Ou a vida assim a ser, a ensinou
Sabia muito, mais do que deveria saber
e muito mais tinha a aprender
com gente que nem ler e escrever, sabe
Sua ânsia de viver, dar e receber
foi e será, ilimitada! (...)


Ana Rosa Cruz




http://poesiasopoesia.blogspot.pt/



eisFluencias





http://www.carmovasconcelos-fenix.org/revista/eisFluencias/51-Abril18/eisFluencias_Abr_2018_8_51-06.htm







Captação



“Nunca acreditei na frase que quanto mais se tem menos se gasta”!


Ana Rosa




sábado, 23 de junho de 2018

Todos os dias





Todos os Dias

(...) Um beijo para quem é Mãe!
Não somente neste dia, 
Em todos os dias que o ano tem
Sem sua existência jamais existiríamos, 
Não seríamos ninguém,
Não seríamos "gente"!
Mãe, é terra, fenda quente
Embalando pequena semente.
Mãe tem dom, o poder de gerar vida.
É célula que se divide e multiplica
Ao fim de nove meses do seu ventre
Brota uma bela flor 
Por ela daria a vida!
Jamais se sentirá sozinha
Mãe é dádiva, é entrega,
Divide-se e multiplica-se
Seu amor, é mais que maior 
é infinito...
Todos os dias se regenera
É colo que sempre espera 
Haja fartura ou miséria
Faça sol, chuva ou frio
Seu olhar, é rio que embala.
Nele transporta seu filho adormecido
Mãe é poço de amor sem fundo
Sem em troca nada pedir.
Dá sempre tudo!
Mãe, é bússola 
Que orienta em alto mar, 
Navio em risco de ir ao fundo
até porto seguro....
Mas Mãe também chora,
Quando sente em seus filhos
as aflições da derrota, 
As inseguranças do futuro.
Mão carinhosa que nos mostra 
o rumo certo do futuro...
Mãe é sempre porta entreaberta 
Sempre à espera, d'um beijo ou carinho.
Sem chave, fechadura ou trinco
Espera quem há muito cresceu
Mas que para "ela", é e sempre será 
Eternamente pequenino.
Tudo dá p'los seus filhos
Até a vida, se tal for preciso
Quem assim ama e se entrega 
p'los filhos em sacrifício
É Santa, é Terra brotando 
mantos de brancos lírios! 
Neste dia de Maio, 
Em todos os lugares do mundo
Mesmo o mais inóspito e esquecido! (...)


Ana Rosa Cruz







Filhos meus



Filhos meus

(...) São meus, os filhos da noite
Sem os ter desejado, ou querido
Vestidos de pele num uivo ferido
Conheço seus trilhos, 
Seus minutos e segundos
Seu olhar triste e perdido, faminto
São navios de papel encalhados
Nas correntezas d'um rio
Em areal movediço
No punho do verso acolhidos
Como anjos caídos no beiral do abismo
Todos eles surgiram da noite
Fugindo ao seu açoite
Um a um, lhes reconheço os passos
As marcas do passado
Seu desejo de horizonte
O seu trémulo riso
Deles reconheço de cor o rosto
Diferentes sentidos
Seus modos diversos
Choram cantos em tristes versos!
Sorrisos que choram 
a dor do castigo
Fugindo do vazio, fruto de quimeras
De horas incertas
São meus, sem os ter parido
De mãos unidas hoje, 
À espera de cada manhã
Oramos a mesma reza (...)


Ana Rosa





Ternura




Ternura

(...) Tinha seda os teus movimentos
Teu toque laços de afetos
Odor a pássaro quente
no seu voar inquieto....
E eu adormecia ouvindo o canto de teus olhos
embalando-me o berço...
Meu sono adormecia lentamente,
de fora para dentro, serenamente
Sonhos de seda voando ao vento
Teu atento silêncio protegia-me dos medos 
Sentindo na boca o inconfundível
gosto de teus beijos, que me acompanharão
na memória de meus caminhos
O carinho de tuas mãos, 
terminava-te na ponta dos dedos.
a caminho do meu rosto em botão
Como se fosse eu passarinho num ninho.. 
Entre o colo de teus joelhos. (...)


Ana Rosa







Xexêtas

(...) Aos olhudos, aos ceguetas
Aos vígaros e falsários
Aos carrancudos, sem dentes
Aos pernaltas e pernetas
De salto alto ou baixo
Aos corcundas e manetas
Aos trolhas atentos e alienados
Aos cornudos de poupa inchada
Aos mendigos surgidos das sarjetas
Aos flautas e flautistas
Aos pragmáticos e pragmatistas
Aos enxadas
Aos cornetas e cornetistas
Aos bicudos liberalistas
Aos patos mudos e aos tretas
Aos adjetivos, aos renegados
Aos carecas e penteados
Aos gadelhudos e abelhudos ferrados
Aos ladinos patriotas
De duas, três ou quatro patas
Aos graxas e aos pracistas
Vendedores de remédio p´rás formigas
Aos bem nascidos e mal vestidos
Aos fados e fadistas
Aos ronhas e casuístas
Aos pinchas e surrealistas
Aos seus olhares em alvo
Aos varões de cortinados
Aos xexés e xexêtas
Aos taralhoucos e tarados
Aos corneteiros tocadores de cornetas
Aos falange falanginha e falangeta. (...)


Ana Rosa


Arte: Internet



Sentir




Sentir

(...) Prefiro escrever
o que me vai no íntimo,
que escrever maravilhas,
mentindo e fingindo 
aquilo que não sinto.
A mentira,
é um precipício e quem dele
se aproxima, 
poderá ao mínimo deslize,
escorregar, enfrentar 
o horror do abismo 
A queda livre
um sem fim, 
ausente de qualquer princípio (...)


Ana Rosa





Jade



Jade

(...) Procuro aqueles versos raros
Recolhidos em algum recanto, 
húmido e escuro, 
a sete chaves trancados 
gruta envolta em penumbra, 
perdida na floresta
adormecidos em almofadas de veludo
em mágoas de amor do passado.
Somente p'los grãos de pó visitados
mas, jamais por alguém lidos ou tocados
Acordá-los, ressuscitá-los, espalhá-los
com eles semear um novo mundo 
fazer florir sorrisos nos lábios
pálidos e crespados, feridos e mudos
Escritos por quem por amor hibernou 
em eterno luto.
Toda a vida viveu escrevendo-os 
para sua amada 
depois de perdidamente 
por ela se ter enamorado
A quem muito a amou e foi amado.
Sua vida fugiu-lhe das mãos, 
ficou só e abandonado
Não seria mais que rima sem poema, 
por alguém jamais declamado
Tudo o que sua vida adoçou, agora amargava.
No descortinar, no ardor da tarde 
branca era aquela flor 
que se abria beijando-lhe os lábios
Era bela, casta e pura 
consigo trazia carícias em pingos de chuva orvalhada
caídos de seu abençoado regaço
derramando com seu olhar de jade
Esperança, ternura, amor e simplicidade
Tudo deixou sem que nada tenha levado
Voou como fada, rumo a um lugar encantado
deixando, espalhadas estrelas em cada frase
abençoando-as com seu condão mágico 
Assim, dos versos se fizeram poemas raros! 
Irreparável foi sua falta 
e o mundo poético
se fez de correntes de ferro e aço
Vazio eterno, muro inultrapassável
Em cada verso uma exaltação de saudade cantada
Perfume delicado, inigualável
Belos e intensos versos 
p'lo tempo tocados 
amadurecido em arcos de saudade.
Como sol, vai amadurecendo cearas 
e castas de uvas douradas,
transformando-os em preciosidades perfumados
Poemas de paixão e joias da alma.
Futuro interrompido, inacabado e magoado
horas de jade, em cada segundo ardem
água é mera metáfora, fogo que arde
jamais a dor da falta apaga.
Hoje escondidos, muito procurados, 
mas jamais perdidos ou esquecidos
ainda por alguns eternamente lembrados
velados em noites, em que as estrelas no céu se calam.
Aos que nunca desistiram de acreditar 
naquelas palavras escritas, entre beijos e lágrimas,
poemas que se desconhece seu princípio
jamais haverá neles a noção de tempo ou espaço,
este é uma miragem!
Como o desenrolar dum novelo de sentimentos,
em que o fio jamais acaba.
Sua folha antes branca, imaculada,
são hoje um verdadeiro monumento 
ao amor e saudade
escrita com o aparo da alma, 
Tecidos de silêncio como bronze frio e sem rasto
escondem-se na escuridão de mão dada
andam não sei bem onde, vagueando como sonhos 
Palavras escritas, entre beijos e lágrimas.
Dizem alguns sábios, que de quando em quando
ainda se ouve o bater de dois corações despedaçados
entre pilastras mortais num poente de lágrimas
quedando-se com beijos ao cair da tarde 
sob um manto de mármore. (...)

Ana Rosa







Profundidade




Profundidade

(...) O cair da noite
Crepúsculo dos lugares
côncavas faces
Profundos olhares
Pestanejastes,amargos
lágrimas sem rostos
rostos sem faces
encobertas no choro das grades
que magoam e amaçam...
Mãos que se pendem 
na queda d’um abraço
Passo cansado 
sombra que passa sem rasto
Sino que badala 
toque rombo, em rudes frases
silêncio que fala, no luar que cala
indefinido sabor, 
adoça, encarraspa e amarga
quebra-se a cada espasmo que passa...
Fim de um dia passado
o subir quebrado, uma escada
uma espécie de luz
um túnel, uma vela que se apaga
o vento que passa
porta entre aberta, janela fechada...
Palavra dispersa, volúvel
em boca retomada
saliva que grita
o respirar de cada fugitiva palavra...
Espelho quebrado
face desfigurada
o principio da madrugada
e tudo começa de novo
face enrugada
expressão que fala e morre na alma
impondo a profundidade
entre a linha do horizonte...
Onde tudo morre e de novo nasce
onde tudo começa e acaba. (...)


Ana Rosa


Arte Sérgio Martinez