O VENDEDOR DE CASTANHAS
Adoro castanhas assadas
Quentinhas.....tão boas
Lembra-me a minha infância
Quando se fazia contas
Ao tostão para sobreviver
Nas frias tardes ao domingo
Passeando por essa Lisboa
Adorava aquele cheirinho
Inconfundível... do assador
De castanhas quentinhas
Com o pacote junto ao peito
Feito de papel de jornal
Aproveitava o seu calor
Para aquecer minhas mãos
Enquanto as ia comendo
E ouvindo o sapateado apressado
Das pessoas dessa Lisboa.
Doce saudade e melancolia
Ouvi um pregão!
"Quem quer quentes e boas...
Estão acabadinhas de assar".
Virei-me e vi seu rosto
Já velho, escuro e encardido
Tinha um olhar meigo
Como que cedendo a um pedido
Dizendo-me adeus...
Também já tinha sido um menino
Herdou esta honrosa profissão
Dum seu bondoso irmão
Que para África embarcou
E de lá não mais voltou
Não sabia ler
Só sabia contar
Mas tinha muitos jornais
Olhava-os de forma fraternal
Neles embrulhava castanhas
Sonhos e amores de Outono
Sonhando um dia aprender a ler
Era ainda menininha
Mas nunca mais esqueci
Aquele abnegado sorriso
Do homem das castanhas
Tinha a cultura da vida
Que nunca foi embalada
Por canções de ninar
Foi embalado por um fogareiro
Que arde às tardes em Lisboa
Ele é eterno
Apregoa como um desafio
No seu peito há uma castanha
Que bate mas não arde
Sua voz é um quadro de pobreza
Quem quer quentes e boas
Quentinhas
Leva mais calor e amor para casa
Este vendedor de amor
É a miséria ambulante
Todos passam por ele
Muitos não param
Ignoram o vendedor de castanhas
E a sua vida de dores tamanhas
Do seu rosto caem lágrimas
De água benta pura
Chuva miudinha, que também apregoa...
Que bela tarde
Para comer uma castanha assada
Nas ruas de Lisboa
"Quem quer quentes e boas.....quentinhas.
Até Ontem
Ana Rosa
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