segunda-feira, 25 de maio de 2015

O Vendedor de Castanhas




 O VENDEDOR DE CASTANHAS

 Adoro castanhas assadas
 Quentinhas.....tão boas
 Lembra-me a minha infância
 Quando se fazia contas
 Ao tostão para sobreviver

 Nas frias tardes ao domingo
 Passeando por essa Lisboa
 Adorava aquele cheirinho
 Inconfundível... do assador
 De castanhas quentinhas

 Com o pacote junto ao peito
 Feito de papel de jornal
 Aproveitava o seu calor
 Para aquecer minhas mãos
 Enquanto as ia comendo
 E ouvindo o sapateado apressado
 Das pessoas dessa Lisboa.
 Doce saudade e melancolia

 Ouvi um pregão!
 "Quem quer quentes e boas...
 Estão acabadinhas de assar".
 Virei-me e vi seu rosto
 Já velho, escuro e encardido
 Tinha um olhar meigo
 Como que cedendo a um pedido
 Dizendo-me adeus...
 Também já tinha sido um menino

 Herdou esta honrosa profissão
 Dum seu bondoso irmão
 Que para África embarcou
 E de lá não mais voltou

 Não sabia ler
 Só sabia contar
 Mas tinha muitos jornais
 Olhava-os de forma fraternal
 Neles embrulhava castanhas
 Sonhos e amores de Outono
 Sonhando um dia aprender a ler

 Era ainda menininha
 Mas nunca mais esqueci
 Aquele abnegado sorriso
 Do homem das castanhas
 Tinha a cultura da vida
 Que nunca foi embalada
 Por canções de ninar
 Foi embalado por um fogareiro
 Que arde às tardes em Lisboa

 Ele é eterno
 Apregoa como um desafio
 No seu peito há uma castanha
 Que bate mas não arde
 Sua voz é um quadro de pobreza
 Quem quer quentes e boas
 Quentinhas
 Leva mais calor e amor para casa

 Este vendedor de amor
 É a miséria ambulante
 Todos passam por ele
 Muitos não param
 Ignoram o vendedor de castanhas
 E a sua vida de dores tamanhas
 Do seu rosto caem lágrimas
 De água benta pura
 Chuva miudinha, que também apregoa...
 Que bela tarde
 Para comer uma castanha assada
 Nas ruas de Lisboa
 "Quem quer quentes e boas.....quentinhas.

Até Ontem

Ana Rosa

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