ESPERANDO PELA LIBERDADE
Hoje, e só por ser hoje
Não saio à rua
Com os cornos enfeitados
Cantando vivas
Por algo que me foi dado
Já há muito não saio
Porque o que me deram
Me foi tudo tirado
Hoje, não saio de minha casa
Está vazia e maior que nunca
Antes, ninguém lá mais cabia
Agora é o palácio da solidão
Só ela e eu lá habitamos
Todos partiram...
Estado de alma, com lástima
Cadeiras ardem em combustão lenta
As colheres jazem nos pratos vazios
As tijelas de sopa são mais fundas
Do que a fome da minha revolta
Represento as ausências pasmas
Os espelhos da casa
Já não fazem plágio de nada
Quebram-se ao ver partir a juventude
Banho-me nas turvas águas do esquecimento
A liberdade da palavra está gasta
Não encheu barrigas
Coisas que mastigo no dia a dia
Com minha dentadura
Hereditária ferragem para as bestas
Sem que me saiba a nada
Arde-me a barriga
Como enganosa ingestão de ortigas
Já não acredito em nada
Já nada digo
Para não me afogar em ideologias
Que me querem vender
Como obras de arte falsificadas
Hoje, já nem cornos tenho
Até isso me tiraram
Não me enfeito em folias e bandeirinhas
Hoje, fico sozinho em casa
Na minha cadeira de baloiço
Que range ao baloiçar
Ao ritmo do pregão de insanidades
Sem cravos na espingarda
Sem cornos enfeitados
Sem serpentinas...
Aguardo no tempo que escasseia
A minha própria liberdade
Até ontem
Ana Rosa
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