CATADOR
Apanho o que deixaram cair de si
Esquivam-se de chegar pesados
Livram-se de si aos bocados
Apanho sentimentos vários
Não os distingo pelo caro e o barato
Tudo eu acho...
Tudo ponho no saco...
Apanho "bluffs" de jogadores
Que fizeram da vida dos outros
autênticos horrores
Dívidas de jogo pagam-se
com grandes dores
Apanho comerciantes à rasca
Que consigo levam o prejuízo
Alegam o direito a ser ressarcidos
Por lucros cessantes
A avareza de hoje
Não é o prejuízo de antes
Apanho gostos e desgostos
Frutos podres acabados de caír
Coisas que as memórias perderam
Que alguém não deu valor
Não há lembrança e saudade
Nem mentira ou verdade
Só a ansiedade de não chegar atrasado
A qualquer lugar
Ou a lugar nenhum
Tudo eu acho...
E ponho no saco...
Apanho bocados de tempo perdido
De pessoas que perderam tempo
A aprender o que não era preciso
Apanho horários imprecisos
Relógios que só dão horas
Aos sábados e domingos
O resto da semana estão de castigo
Apanho relógios sem conserto
Relógios de fantasia
Não prestam para nada
São uma porcaria
Os ponteiros estão parados
Só dão horas certas
À meia-noite e ao meio dia
Tudo eu acho...
Ponho no saco...
Apanho memórias vividas
De coisas que se plantaram
E nunca colhidas
Cada um irá colher o que plantou
Se não plantou nada tem para colher
Apanho segredos
Fechados a sete chaves
Agora cabe-me dar voz
A estes sarilhos calados...
Apanho doçuras envenenadas
Esperanças congeladas
Assassinatos, mascarados de suicídio
Apanho segredos de almofada
Histórias mal contadas
Bocados de corações partidos
Açoitados por terem comido
O fruto proibido
Até ontem
Ana Rosa
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