domingo, 15 de janeiro de 2017

Inverno






INVERNO

(...) Serra minha... vesti-te hoje de neblina
Ao unir tua alma à minha
Fiz de ti minha rainha
Do meu frio fiz teu agasalho
Com agulhas e linhas, retalhos de nevoeiro
Penas deixadas p'los pássaros
Teci-te um manto branco, imaculado, belo e vasto
Desci à rasa planície, vindo lá do alto da colina
De palidez sombria, desci veredas de terra batida
Com leves e delicados passos...
Para que minha presença, fosse censurada p'lo atraso.
Embalei-te em meu regaço...
Trazendo-te no colo de meus gelados braços
Aquietei-te em mim com minha aragem fina
Ungindo-te com pingos de orvalho
Limpei lágrima tua, nesse teu olhar opaco
Eternizei expressão tua, silenciosa e pausada
Cheia de beleza e graça
Moldei-te com gestos em curvas de ternura
Como quem acaricia uma obra de arte
Coroei-te com grinaldas e pérolas de geada
Prendi-te em fiadas de fitas de chuva 
Em apertado laço 
Honrei-te com meus tambores 
E relampejos de trovoada...
Para ti, desenrolei a carpete cinzenta 
De tumultuosa tempestade
De tal forma te amei, como jamais por alguém,
Serás assim, tão amada! 
Ofertei-te nuvens de diamantes e opalas, 
Para com seu brilho, em longas noites
Te parecessem belas madrugadas...
Deixei que sentisses minha friagem
Impondo-te meus incompreensíveis ismos
Em sílabas geladas...
Pus a teus pés as sombras crepusculares
Da sombria tarde...
Deixei que minh'alma à tua se unisse
Dei-te a visão das pedras cobertas de verde musgo
Fruto de minha humidade...
Dar-te-ei ao madrugar cânticos de gélido musicar
Pingando em choro de geada sentida
P'los acordes dum violino
Dou-te minha casa a céu aberto 
Com a visão nevada para o silêncio da serra
Poderás dela vislumbrar
O belo manto de neve prateada
Pela vidraça entreaberta, feita de chão e terra alagada
Que no inverno, para e adormece
Na longa e inquieta espera de horas frias
Em terras da Beira Baixa (...)

Até Ontem

Ana Rosa Cruz

Arte:NovelandArt











Sem comentários:

Enviar um comentário